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terça-feira, 10 de abril de 2012

O Dez não me Atrai (depoimento sobre bullying)


O Dez não me Atrai

Juliano tinha 14 anos e era mais inteligente do que eu e você juntos.
A matéria era sobre pessoas com várias habilidades, antigamente chamados de superdotados. Encontrei Juliano por meio do colégio que estudei na adolescência. Eu tinha más lembranças de lá. Estremeci ao telefonar e ouvir do outro lado da linha a voz do professor que tanto me assombrou. Ao me reconhecer, foi amigável, como se todo o bullying não tivesse existido.
Sem me deixar afetar, expliquei a matéria e sugeri que me indicasse um aluno “nota dez”, literalmente. Alguém que só tirasse notas boas, fosse um crânio. O primeiro nome que o professor citou foi o de Juliano. Me passou o contato e, no mesmo dia, falei com o menino por telefone. Tímido, imaginei-o quase um nerd, com o brilho daqueles que recebem elogios demais.
Fui ao apartamento dele, onde morava com os pais e o irmão menor. Sua mãe, jovem e bonita, orgulhava-se pelo filho que saiu melhor do que a encomenda. Juliano não era nem um pouco como eu imaginava. Descolado, adorava videogame e quebra-cabeças. Perguntei se ele estudava muitas horas por dia.
- Que nada! – respondeu. – Apenas presto atenção nas aulas e anoto os pontos mais importantes. Assim, tenho tempo para ficar com meus amigos a tarde toda.
Juliano realmente era muito inteligente e perspicaz, diferente daquele estereótipo de adolescente neurótico. Me identifiquei com ele. Eu, com meus 14 ou 15 anos, gostava muito de praticar esportes – amava kung fu -, adorava estar com meus amigos e não era fascinada pela internet.
Mas existe uma diferença berrante entre Juliano e a adolescente que eu fui: eu era uma péssima aluna. Não porque bagunçava. Mas sim porque não sabia prestar atenção. A janela e o mundo que havia entre suas esquadrias eram mais atraentes. E eu era o alvo fácil para o estresse de alguns professores.
Certa vez, quando eu tinha 14 anos, estava na sala de aula enquanto o professor tentava ensinar matemática. Mas eu não assistia a aula – olhava para o horizonte do mundo, pela janela, e pensava em outras coisas mais importantes para o meu coração. O professor me chamou assim:
- Hei, garota distraída! Tá pensando na vida?
Levei um baita susto. Endireitei-me na carteira e fiquei vermelha. Não respondi. Rezei para que ele não estivesse falando comigo. Mas estava.
- As suas notas devem estar muito boas, para você achar que pode ficar olhando pela janela! Pois suas notas não estão boas, não, garota distraída. Você tá ferrada. É bom esquecer a janela e prestar atenção nas aulas! Se é que dá tempo ainda de passar de ano…
Em choque, com o choro paralisado na garganta, tentei prestar atenção no restante da aula, mas aqueles números não faziam sentido para mim. Anotava restos de explicações, com as lágrimas correndo, uma a uma, pelas bochechas e pescoço.
Eu nunca consegui contar isso para ninguém. Meus colegas foram testemunha, e também não comentaram isso comigo. Apenas me olhavam com pena, minutos depois do acontecido. Na época, eu achei que merecia isso. Eu tirava notas baixas e era ridicularizada – tanto por alunos quanto por professores. Eu me sentia uma vilã por não conseguir prestar atenção nas aulas. Era tão mais gostoso olhar pela janela ou desenhar no caderno de ciências. Inventei milhares de personagens, roteiros e histórias em quadrinhos para preencher minha distração.
Às vezes, faziam comparação comigo. “A Mariana é tão boa aluna, tira notas tão boas, por que você não consegue?” Eu não sabia a resposta para isso. Apenas invejava secretamente a “inteligência” de meus amigos. Alguns tentavam me ensinar as fórmulas de matemática em vão. Eu só sabia a fórmula harmoniosa para desenhar um rosto com lápis 6B.
Sempre que lembro das humilhações que passei, me bate uma revolta que nasce devagarzinho e, quando me dou conta, o sentimento é um monstro dentro de mim. Tenho raiva dos adultos que me chamaram de criança burra. Que nunca entenderam que seres humanos são heterogêneos, ninguém aprende da mesma maneira.
Faltou, na minha infância e adolescência, uma pessoa com bom senso que dissesse: parem de chamar a menina de burra, vamos ensinar a vida de uma outra maneira.
Eu engoli ensinamentos quadrados que hoje não fazem nenhum sentido para mim.
Hoje sou jornalista formada. E muitos dos bons alunos se perderam por outros caminhos. E aquele professor continua no mesmo lugar, com a mesma cara, fazendo as mesmas coisas. Humilhando outras crianças.
Juliano, parabéns pela sua inteligência, mas saiba que a vida também precisa de espontaneidade. Lembre-se de errar de vez em quando também. Tirar dez, toda vida, é chato e enfadonho. Divirta-se de vez em quando com um 9,9. Com amor, Garota Distraída.



Vídeo contra o bullying

Com a produção e a exibição de filmes, estudantes de Pernambuco começam a mudar a realidade de conflito e desrespeito na escola

Marcelo Volpato 


O caso real

A EE Madre Lucila Magalhães, de Vitória de Santo Antão, a 53 quilômetros de Recife, em Pernambuco, não é a mesma de quatro anos atrás. Na época, o desrespeito entre alunos era generalizado. “Os alunos se xingavam muito, o que acabava gerando agressões físicas também. Existia muito racismo e uma disputa entre estudantes de diferentes comunidades. Até o patrimônio da escola sofria ações de vandalismo”, conta João Francisco da Silva, professor de História.

Mas o “Stop Bullying”, um projeto de produção e exibição de filmes, liderado por Silva, trouxe novos ares para toda a escola, que atende 1100 alunos.
“Quando resolvi trabalhar assuntos ligados aos Direitos Humanos, em 2008, busquei fazer com que os alunos vivenciassem algumas situações na prática para que percebessem que as ações de violência precisavam ser erradicadas da escola porque comprometiam os laços de uma boa convivência”, explica Silva, que convidou seus alunos para produzir filmes sobre os problemas cotidianos de suas vidas, como drogas, violência, rivalidade e falta de respeito.
Primeiramente, o grupo escolhe o tema a ser trabalhado. Faz-se uma pesquisa sobre ele e só então se inicia a redação do roteiro. Depois vêm os ensaios e, por fim, a gravação e edição. A encenação torna possível problematizar temas difíceis de tratar por meio de debates reais. “A ficção transformou a realidade de nossos alunos”, analisa.
A participação dos alunos é garantida por meio de um revezamento das funções: roteiro, iluminação, manutenção, atuação. “Nunca deixo que ninguém fique de fora”, comenta o professor. 

De 20 integrantes iniciais, hoje o projeto já conta com 120 alunos do Ensino Fundamental e Médio que participam dos encontros semanais no contraturno. Além de exibir os filmes nos espaços da escola, o grupo organiza apresentações em locais públicos da comunidade do entorno.

Aos poucos, o professor conseguiu mobilizar os alunos para uma discussão em torno dos problemas mais recorrentes na vida escolar e sobre a necessidade de mudança de comportamento. O problema não foi completamente extinto, mas uma iniciativa importante já foi tomada. “Antes, os alunos resolviam tudo por meio da violência. Hoje, eles procuram alternativas, principalmente, o diálogo para mediar conflitos dentro e fora do espaço escolar”.



Palavra de especialista
Casos de bullying sempre existiram no ambiente escolar.
O que tem mudado, ao longo do tempo, é a forma como estes profissionais estão lidando com ele.
 “O problema não é ter conflitos na escola e sim como os educadores podem intervir de forma mais construtiva”, explica Adriana de Melo Ramos, pedagoga e doutoranda em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O primeiro passo para se combater o bullying é identificá-lo e aceitá-lo.
Para a pesquisadora, cabe aos professores e gestores estudar e debater o tema, planejar intervenções diretas com os alunos, levar a discussão às famílias e trabalhar com os espectadores. “Só existe bullying porque existe plateia. E é nesse público que os educadores devem focar ações mais específicas”.
Na avaliação de Adriana, o projeto “Stop Bullying” teve a sensibilidade de discutir temas de interesse dos próprios alunos por meio de histórias fictícias, o que contribuiu para que o grupo não se sentisse ameaçado. “É muito mais fácil para as crianças refletirem sobre situações hipotéticas para depois pensar em situações reais porque gera um envolvimento maior”, explica.
Mas a pedagoga chama a atenção para a necessidade de se desenvolver um trabalho de formação continuada com todos os educadores da escola, para que contribuam com a construção de um ambiente mais cooperativo e respeitoso.
 “Isso não pode acontecer apenas nas aulas do professor João, mas nas diversas aulas que os alunos frequentam, assim como na relação com a equipe gestora”, alerta.

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